Como se sabe, o mundo é movido pela economia, por interesses financeiros e empresariais. As discussões sobre o futuro regulatório da Cannabis, para fins medicinais ou recreativos, não fogem a essa regra. Ao contrário do que muitos pensam, as diversas aplicações da Cannabis sativa e a sua legalização não estão ligadas à moralidade, mas sim ao dinheiro: é ele que define o progresso ou estagnação das normas sobre o medicamento.
Em recente pesquisa do DataSenado em parceria com a senadora Mara Gabrilli¹, verificou-se que três em cada quatro brasileiros são a favor da Cannabis Medicinal. Leis relativas à Cannabis Medicinal já passaram na Alemanha, África do Sul, Irlanda, México, Argentina, Rússia, Austrália, Israel, Índia e em quase toda a Europa Ocidental.
Além da aplicação medicinal, a Cannabis representa um enorme potencial como commodity agrícola, na rotação de culturas, na remediação do solo e na indústria têxtil, por exemplo.
O artigo do “Congressional Research Service”, do Congresso Americano, redigido por Renée Jhonson – Specialist in Agricultural Policy, em 22 de junho de 2018, informou aos congressistas dos Estados Unidos que “o mercado global de cânhamo é composto por mais de 25.000 produtos em nove submercados: agricultura, têxteis, reciclagem, automotivo; móveis, alimentos e bebidas; papel, materiais de construção e cuidados pessoais.
Então, por que o Brasil, a maior potência agrícola do mundo, não se interessa pela Cannabis, em qualquer uma de suas aplicações?
Por que o Brasil, apenas depois de uma guerra travada por corajosas mães de crianças com epilepsia refratária, liberou o uso da Cannabis para fins medicinais?
Porque os interesses econômicos ligados à repressão das drogas temem perder o seu poder e os seus lucros. A indústria farmacêutica, em parte, preocupa-se em perder os lucros que cercam os analgésicos, conhecidos como “opiáceos”, além dos lucros gerados pela venda de remédios ultrapassados de uso psiquiátrico.
Se não fossem esses interesses, o Brasil estaria seguindo o exemplo dos EUA e do Canadá que transformaram a cultura do hemp /cânhamo em negócios de bilhões de dólares, mudando a economia e a vida das pessoas. Como país subdesenvolvido, econômica e culturalmente, as mudanças demoram a chegar, mas chegam.
Nos próximos anos, o Brasil deve seguir a tendência dos americanos, liberando o plantio e a produção do hemp/cânhamo, uma subespécie da Cannabis sativa L que é rica em canabidiol e com baixos teores de THC.
Na maior parte dos países desenvolvidos, o canabidiol é tratado como um suplemento alimentar, como se fosse uma Vitamina “C”. O Brasil deverá seguir a mesma tendência, deixando de exigir prescrição médica e autorização da Anvisa para aquisição desses produtos.
Apesar de a grande parte dos políticos brasileiros usar a Cannabis para discursos fundamentalistas e discriminatórios, a tendência é que o Brasil aprove leis mais modernas sobre o tema, mirando uma melhora civilizatória, como ocorre nos países desenvolvidos.
1 – https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado/materias/pesquisas/tres-em-cada-quatro-brasileiros-apoiam-a-producao-de-medicamentos-a-base-de-cannabis
Sobre o autor: Fabio Candello é advogado, formado pela PUC-Campinas, pós-graduado na primeira turma de Direito Penal Empresarial da Fundação Getúlio Vargas. Atualmente, é professor de Direito Penal e Processo Penal e CEO da Icann Brasil e fundador do escritório Candello Advocacia.