Por Ana Claudia Marques
A Cannabis Medicinal, desde sua regulamentação de uso pela Anvisa, precisa ser receitada por profissionais habilitados a prescrever medicamentos. A Odontologia, tanto quanto a Medicina, forma profissionais capacitados para tanto. Mas só agora, em abril de 2022, pacientes com prescrição feita por dentistas conseguem inserir o número de CRO do profissional na autorização para uso particular exigido pela Anvisa.
Muitos profissionais já prescrevem a Cannabis Medicinal, mas o material de estudo e pesquisa para a odontologia, em sua maioria, vem do exterior. Este artigo vem trazer uma visão geral de como profissionais, aqui e no estrangeiro, vem utilizando a Cannabis Medicinal com seus pacientes.
Uso medicinal da Cannabis ontem e hoje
Antigas culturas e seus sistemas médicos, como a medicina tradicional chinesa, ayurvédica, africana, árabe e mesmo os gregos, pais da medicina moderna, usavam o potencial terapêutico das plantas para tratar problemas bucais, entre eles as dores de dente, cáries, gengivites, halitose, feridas e abcessos na boca e na gengiva.
As antigas culturas também utilizavam plantas para remover a placa bacteriana (com bastões de mascar) e sabiam de seus efeitos analgésicos, anti-inflamatórios e anti sépticos.
A Cannabis Sativa L. é utilizada na medicina tradicional oriental, até hoje, para a prevenção de cáries, redução de inflamação na gengiva e para a dor de dentes.
Nossa moderna ciência permitiu descobrir que os receptores do sistema endocanabinóide se distribuem também na boca, validando o uso do canabidiol (CBD) em patologias na cavidade bucal, devido a seu potencial analgésico, anti-inflamatório,antimicrobiano, ansiolítico e anti hemético.
Se entendermos que o mundo ocidental passou menos de cinquenta anos tentando omitir o potencial terapêutico da Cannabis, com a política de “guerra às drogas”, ao mesmo tempo em que as grandes farmacêuticas cresciam, podemos também perceber que a história da Cannabis é muito mais antiga e merece ser respeitada e estudada.
Foi com referências em artigos publicados até o final do século XIX que Raphael Mechoulam começou a pesquisar o potencial terapêutico da Cannabis, por volta de 1960, isolando, nos anos subsequentes, o CBD e o THC. Nos anos 1990 ele também descobriu os endocanabinóides. Junto com outros pesquisadores, apresentou ao mundo o Sistema endocanabinóide e suas funções pré-homeostáticas, ativando enzimas e hormônios para o bom funcionamento do organismo.
Embasados pelas descobertas científicas, o uso milenar da Cannabis para fins medicinais pode ser retomado no século XIX.
Vejamos agora alguns usos da Cannabis Medicinal em odontologia, já documentados em pesquisas.
Ansiedade Odontológica
Medo da cadeira de dentista não é algo a ser minimizado. Estudos mostram que pessoas atemorizadas com o tratamento dentário carregam esse trauma desde a infância. Estes indivíduos deixam de fazer visitas profiláticas e cuidar de dentes e gengivas, resultando em perda dentária e inúmeros problemas paralelos: reflexos na saúde e qualidade de vida geral, alterações no padrão de sono, baixa autoestima e prejuízo em interações sociais, sejam elas profissionais ou pessoais.
Ainda que existam abordagens sem uso de fármacos para gerenciar a ansiedade odontológica, como terapias comportamentais e hipnose, há quem necessite de forte sedação para que o tratamento seja realizado.
O CBD pode ser utilizado nesses casos, devido ao seu potencial ansiolítico. A utilização do CBD pode ser pontual, antes da consulta odontológica, tanto para a ansiedade quanto para aumentar o limiar de dor do paciente.
Dor de dente e tratamento de cáries
Dor de dentes e cáries atingem o mundo todo, sendo consideradas problemas de saúde pública. A dor pode ser causada por problemas no dente (irritação, infecção, lesão), cáries, danos nas estruturas dentárias e hipersensibilidade dos nervos.
A cárie é resultado, entre outros fatores, da ação de bactérias, que formam placa e biofilme nos dentes, resultado da ingestão de doces, sem a posterior limpeza adequada, o que causa a erosão do esmalte.
O CBD tem propriedades antibacterianas importantes, e outros canabinóides, como o canabicromeno, o cannabigerol, o THC e o canabinol também combatem várias cepas de Staphylococcus aureus, resistentes ao tratamento com meticilina.
Estudos mostram que enxaguantes bucais com infusão de canabinóides inibem a atividade bacteriana com a mesma eficácia da clorexidina. Outros usos do canabidiol são suplementando o pó de polimentos dentários e também usando algumas gotas de óleo CBD diariamente.
Síndrome da Boca Ardente
A Síndrome da Boca Ardente provoca a sensação de queimação crônica ou recorrente em várias áreas da cavidade oral e é caracterizada como dor neuropática, tendo como causa provável alterações dos nervos sensoriais do Sistema Nervoso.
Os canabinóides, como CBD, podem auxiliar na ativação do Sistema Endocanabinóide, para que haja a regulação do Sistema Nervoso, aliviando os sintomas da síndrome.
Doença Periodontal
O acúmulo de placa bacteriana no tecido gengival causa a inflamação e sangramento gengival. As doenças periodontais, como gengivite (estágio inicial) e periodontite (estágio avançado) se caracterizam pela inflamação e irritação da gengiva. Sem tratamento, leva à perda óssea e até mesmo do dente, além de estar correlacionada com outras doenças sistêmicas.
No caso da doença Periodontal, pesquisas mostram que os canabinóides como CBD e THC podem ser utilizados devido à ação antiinflamatória, imunossupressora, antioxidante e analgésica no tecido gengival.
Mucosite Oral
A mucosite oral é uma complicação decorrente da quimioterapia e radioterapia utilizadas no tratamento de câncer. Estas terapias atingem também os tecidos saudáveis, causando inflamação e ulceração das membranas mucosas da cavidade oral.
O CBD, segundo estudos, pode ser utilizado por suas propriedades antioxidantes e minimizar os sintomas da mucosite oral.
Mais algumas considerações sobre o uso de canabinóides
Inúmeras pesquisas existentes em outros campos da clínica médica, trazem evidências do potencial terapêutico da Cannabis também na odontologia:
- efeitos analgésicos;
- antioxidantes;
- antimicrobianos;
- anti-inflamatórios;
- antipruriginosos e outros.
Além disso, são uma alternativa segura e natural às drogas sintéticas e produtos odontológicos e orais comercializados.
No caso de pacientes especiais, com quadros de comprometimento neurológico e motor, o uso da Cannabis Medicinal também pode ser de grande valia, como adjuvante ao tratamento odontológico, se considerarmos também seu potencial ansiolítico e relaxante muscular, preparando o paciente para um tratamento mais tranquilo.
Também em patologias dolorosas e debilitantes que se entrecruzam com quadros ansiosos, como é o caso do bruxismo, alterações na Articulação Temporo-Mandibular e Nevralgia do Trigêmeo, a indicação da Cannabis Medicinal pode trazer de volta ao paciente uma vida de qualidade, com o alívio também da dor, relaxamento da musculatura e melhora do sono.
Se você é profissional odontologista e quer oferecer a terapia Canabinóide a seus pacientes, fale com nosso Suporte para obter orientações.
Ana Claudia Marques é redatora da CBD Fast Lane, escritora, Terapeuta Ocupacional, pós-graduada em Medicina Tradicional Chinesa e terapias integrativas, além de estudiosa sobre o potencial terapêutico das plantas.