Você sabe o que é esquizofrenia? É um distúrbio psiquiátrico marcado por surtos onde a realidade desaparece, substituída por delírios e alucinações. Esquizofrenia, em grego, significa “mente dividida” e afeta mais de 2 milhões de brasileiros.
O início é insidioso, no período entre 15 e 35 anos, com apatia, seguida de abandono de atividades diárias e isolamento social, além de ausência de expressão de sentimentos perante fatos felizes ou tristes. Com o passar do tempo, a sensação de estar “desajustado” se transforma em delírios, alterações sensoriais, teorias da conspiração e alucinações.
A Cannabis medicinal pode ajudar a controlar os sintomas da esquizofrenia e também os efeitos colaterais do tratamento convencional, como veremos ao longo deste artigo. Afinal o uso da Cannabis para o alívio de sintomas psiquiátricos está registrado há mais de 3 mil anos na medicina Ayurvédica, bem como na Medicina tradicional chinesa. Mesmo no Ocidente, até o início do século XX a Cannabis medicinal era utilizada para “transtornos mentais”. Seu uso declinou com o aparecimento de novas drogas hipnóticas e sedativas – muitas usadas até os dias atuais.
Fato é que, à luz das novas pesquisas, o que os antigos já sabiam sobre a medicina canabinóide vem se confirmando. O uso medicinal da cannabis em pacientes com esquizofrenia com o devido acompanhamento médico, pode ajudar os pacientes a reduzirem os episódios de surtos e terem qualidade de vida, com disposição e interação social.
Esquizofrenia – qual a causa e o que novos estudos sugerem?
É consenso que a alteração na disponibilidade de dopamina e glutamato no cérebro, dois importantes neurotransmissores, deflagra os episódios esquizofrênicos. Fatores genéticos e infecções maternas durante a gestação também estão relacionados com o aparecimento da esquizofrenia na juventude/vida adulta.
Em artigo publicado na Revista Científica da Fapesp em 2021, novas hipóteses foram apresentadas sobre a origem da esquizofrenia e sua evolução, envolvendo não só a disfunção dos neurônios, mas em três tipos de células da glia – entre eles, os oligodendrócitos, responsáveis pela produção da bainha de mielina.
As células da glia, sabe-se hoje, fazem parte da barreira imunológica cerebral, barrando ataques de corpos estranhos ao tecido nervoso. Quando isso acontece, há inflamação local – e uma redução das funções cerebrais, buscando o repouso e a recuperação do tecido inflamado. Esse processo inflamatório é encontrado em quadros ansiosos e depressivos também.
No caso da esquizofrenia, descobriu-se que há danos à bainha de mielina dos oligodendrócitos, o que prejudica a transmissão dos impulsos nervosos corretamente e acarreta os delírios e alucinações característicos.
Nos experimentos realizados em culturas de oligodendrócitos humanos na Unicamp, o CBD ativou mecanismos bioquímicos de neuroproteção, impedindo a desmielinização da bainha.
Para os cientistas envolvidos nessa e outras pesquisas, os resultados apontam para novas perspectivas de tratamento da esquizofrenia, sem alguns efeitos colaterais apresentados por drogas utilizadas atualmente, como ganho de peso, com a clozapina, ou tremores e sonolência, com o haloperidol.
Outro fator que pode deflagrar a doença é a incapacidade de regiões cerebrais – como o córtex pré-frontal e o tálamo – processarem a glicose, tornando o metabolismo local lento.
Isto provocaria um desequilíbrio entre os estímulos de excitação e inibição de certos neurônios, interferindo na liberação do glutamato (neurotransmissor excitatório) e aumentando a liberação de dopamina em excesso – levando à alucinações e delírios.
Também nesse caso, em modelos animais, o CBD teve efeito neuroprotetor nos astrócitos e na microglia expostos à toxicidade dos altos níveis de glutamato.
A terapia canabinóide na esquizofrenia
A terapia canabinóide ainda sofre com muito preconceito, desinformação e notícias distorcidas. Uma destas notícias que circulam constantemente em sites e redes sociais associa o uso (recreativo) da cannabis com o surgimento de episódios psicóticos e de esquizofrenia, numa relação de causa e efeito que não se comprova após estudos sérios.
É correto afirmar que a cannabis pode causar alucinações, no caso de consumo pesado ou de cepas com alta porcentagem de THC. No mais das vezes a cannabis provoca um relaxamento e calma, motivo da busca pela experiência por milhares de usuários.
Um artigo no site Project CBD cita dois importantes estudos sérios, que vinculam a predisposição do jovem à desenvolver a esquizofrenia ao uso abusivo de cannabis, álcool e cigarro. Lembrando que os primeiros sinais da esquizofrenia são a apatia e a perda de interesse em desenvolver atividades e socializar, faz sentido que um indivíduo pré-esquizofrênico busque sair de sua realidade “negativa” com frequência através de drogas lícitas ou ilícitas que lhe devolvam, ainda que momentaneamente, a sensação de prazer.
Nesse caso, as estatísticas precisam ser compreendidas de forma reversa: indivíduos com sintomas iniciais de esquizofrenia são mais atraídos para o consumo da cannabis, para alívio dos sintomas, e isso pode acelerar o desenvolvimento da doença – daí as estatísticas “comprovarem” uma falsa relação de causa e efeito.
Esquizofrenia e o segundo cérebro
Se na medicina oriental o intestino já era considerado o segundo cérebro há milênios, hoje a medicina ocidental também reconhece esse fato. A saúde intestinal está intimamente ligada com nossa saúde emocional, visto que há 500 milhões de neurônios controlando não só os movimentos peristálticos, mas também acionando o sistema imunológico (na presença de algum agente patológico) e produzindo 90% da serotonina que circula no corpo – entre outros 30 neurotransmissores. A saúde da microbiota intestinal também é relevante para nossa saúde emocional, é o que várias pesquisas ao redor do mundo confirmam.
Um artigo na Veja saúde relata a conexão entre distúrbios digestivos, síndrome do intestino irritável e distúrbios metabólicos que se relacionam intimamente com as manifestações da esquizofrenia, Mal de Parkinson, Alzheimer, autismo, depressão etc. Um estudo brasileiro com mulheres conseguiu correlacionar problemas intestinais com alterações de humor e perda de concentração em tarefas cotidianas.
Outro artigo no Project CBD relata sobre uma pesquisa em Copenhagen analisando registro de mais de 20 mil casos de esquizofrenia, confirmando a hipótese de que a saúde intestinal e o equilíbrio metabólico estavam comprometidos naqueles pacientes.
Interessante notar que o uso do CBD em pacientes com esquizofrenia está relacionado à “diminuição do risco de distúrbios da interação intestino-cérebro e doença inflamatória intestinal”. De acordo com os cientistas, “esquizofrênicos usuários de cannabis eram 30% menos propensos a ter Doença Inflamatória Intestinal e 10% menos propensos a ter distúrbios digestivos graves”.
Portanto, o CBD cuida da saúde intestinal também, que reflete nas variações de humor e ânimo para as tarefas cotidianas – sintomas presentes na esquizofrenia.
Mais pesquisas e estudos sobre uso do CBD na esquizofrenia
Na esquizofrenia o indivíduo apresenta, inicialmente, uma crescente apatia, uma retração das atividades sociais, profissionais e um embotamento das emoções. Com o tempo, iniciam-se delírios persecutórios e alucinações. O indivíduo vive e interage com uma outra realidade. A esquizofrenia surge entre os 15 e 35 anos, afetando não só o paciente, mas a família, que precisará lidar com as manifestações da doença. Existem vários tipos e graus de gravidade na esquizofrenia.
A doença evolui em surtos, com alucinações e delírios. Quando sai do surto, o paciente pode deprimir com a consciência do que ocorre com ele. O uso do CBD vai ajudar nos dois períodos.
Um estudo brasileiro sobre o uso terapêutico da Cannabis demonstrou que o CBD pode reverter a redução de interação social, possui ação ansiolítica, anti psicótica (sem induzir à catalepsia), inibe a hiperlocomoção, atenua sintomas dissociativos – como despersonalização – e não causa efeitos colaterais como outras drogas psiquiátricas.
Outro ensaio clínico, com 42 pacientes com diagnóstico de esquizofrenia confirmaram estes resultados acima, num teste realizado durante episódios agudos, comparando a eficácia do CBD com outro antipsicótico, a amisulprida. Com o CBD houve a redução dos sintomas psicóticos, tanto quanto com a amisulprida, porém com menos efeitos colaterais.
Outro estudo recente testou os efeitos de baixas doses de THC em pacientes com esquizofrenia, refratários aos tratamentos convencionais. O que se viu foi uma melhora significativa em mais de 60% dos pacientes, com o uso oral de THC junto com antipsicótico.
O site Project CBD cita uma pesquisa italiana da Universidade de Cagliari, com ratos expostos na gestação a um agente inflamatório que causava sintomas de esquizofrenia, tratados posteriormente com o THC – no período que corresponderia à adolescência humana. Os cientistas basearam-se na teoria dos “dois golpes” que podem desencadear a esquizofrenia. O primeiro pode ser um processo inflamatório que a mãe passe no período gestacional, afetando a formação cerebral do feto e o segundo, o uso da maconha ou outra droga, desencadeando os surtos psicóticos.
Na experiência acima, os cobaias adolescentes receberam uma dose de THC, para testar a teoria de que o uso da cannabis induz à indivíduos predispostos a desenvolver surtos psicóticos. Interessante notar que a exposição ao THC teve efeito neuroprotetor e anti-inflamatório no cérebro dos ratos, diminuindo a hipersensibilidade inflamatória recebida no ventre, devido à regulação do Sistema endocanabinóide.
Outro estudo cita um fator relevante a se levar em conta: a terapia canabinóide não causa efeitos psicoativos, no raciocínio e na segurança, é bem tolerado pelo organismo (mesmo com uso crônico) e tem amplo espectro de ações farmacológicas.
Também é relevante citar que o CBD não produz tolerância no organismo – isto é, a dose que faz efeito inicialmente será mantida sempre – não causa dependência nem tampouco crise de abstinência.
Todo tratamento com Cannabis Medicinal deve ser indicado e acompanhado por um profissional habilitado a prescrever e avaliar o caso do paciente, possíveis interações medicamentosas e riscos em caso de comorbidades.
Se você quer saber se a terapia canabinóide é possível em seu caso ou de um ente querido, fale com nosso Suporte, para que indique um profissional prescritor e tire suas dúvidas.
Ana Claudia Marques é redatora da CBD Fast Lane, escritora, Terapeuta Ocupacional, pós-graduada em Medicina Tradicional Chinesa e terapias integrativas, além de estudiosa sobre o potencial terapêutico das plantas.