Por Ana Claudia Marques
Você sabia que as mulheres podem se beneficiar do uso da Cannabis Medicinal?
Estudos específicos sobre o impacto do uso da Cannabis no organismo feminino ainda são poucos, mas promissores. Os fitocanabinóides atuam sinergicamente com o Sistema Endocanabinóide, regulando diferentes fatores ao estimular ou reprimir a secreção de neuro hormônios, que afetam as atividades emocionais, imunológicas, reprodutoras, de percepção de dor, do ciclo do sono, da percepção de fome, multiplicação celular, apoptose (ciclo de vida e morte da célula), entre outras.
O corpo feminino possui particularidades que precisam ser consideradas, principalmente no que diz respeito à flutuação mensal de seus hormônios. Muitas condições clínicas pelas quais as mulheres procuram o auxílio médico tem sua origem nesse mecanismo hormonal, como por exemplo, a TPM, cólicas menstruais e enxaqueca.
Também é importante saber que há quadros clínicos que ocorrem mais em mulheres do que em homens. A fibromialgia, a depressão e ansiedade, além de várias doenças autoimunes são bons exemplos disso.
Fisiologia feminina- como funciona o corpo da mulher
Dentre os estudos sobre os efeitos da Cannabis Medicinal, poucos são os que dão atenção específica ao que ocorre no organismo feminino. Os hormônios femininos impõem ciclos ao corpo da mulher que não podem ser desconsiderados. Estudos mostram que o Sistema endocanabinóide (alvo dos fitocanabinóides da Cannabis) está intimamente ligado com o bom funcionamento hormonal da mulher.
Vamos entender primeiramente como funciona o corpo feminino.
Hormônios e características sexuais
No útero, até a sétima semana de gestação, não existe diferenciação sexual. A partir da sétima semana, as gônadas começam a se diferenciar. A ausência de cromossomos Y vai fazer a gônada se diferenciar em ovário. Este ovário primitivo vai secretar o estrógeno, e isso resultará no desenvolvimento do restante do aparelho reprodutor feminino.
Ao longo da infância e adolescência, a ativação hormonal das gônadas será responsável pelos caracteres sexuais secundários (distribuição do pelo e do panículo adiposo, timbre de voz, aparecimento dos seios etc.).
Hormônios e ciclo menstrual
O ciclo menstrual é decorrente da secreção alternada de quatro principais hormônios: estrógeno e progesterona (secretados principalmente nos ovários), Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo Estimulante (FSH), sendo os dois últimos secretados pela hipófise. A hipófise é uma glândula endócrina localizada na base do cérebro.
No início do ciclo, quando a menstruação ocorre, há liberação pela hipófise de pequenas quantidades de FSH e LH, que juntos provocam o crescimento e amadurecimento dos folículos ovarianos . À medida que crescem, os folículos induzem o aumento da produção de estrógeno.
O aumento do nível de estrógeno estimula o crescimento do endométrio (isto é, engrossa a parede do útero, junto com proliferação de vasos sanguíneos, esperando a implantação de um óvulo fecundado). Ao mesmo tempo, a alta concentração de estrógeno faz reduzir a secreção do LH e FSH, para, em seguida, ter um “pico” dos dois hormônios, o que ocasiona a liberação do óvulo.
O que restou do folículo ovariano (que liberou o óvulo) forma o corpo lúteo, que vai secretar estrogênio e muita progesterona. Objetivo? Manter a gestação, caso o óvulo seja fecundado. Caso a fecundação não aconteça, caem os níveis de todos os quatro hormônios, e o endométrio descama, ocorrendo a menstruação e se iniciando um novo ciclo.
Caso ocorra a fecundação, há a produção do hormônio Gonadotrofina coriônica pela placenta. Ele impede a degeneração do corpo lúteo, que vai continuar produzindo estrógeno e progesterona, essenciais para que a gravidez tenha continuidade. Durante a gravidez, os outros dois hormônios, LH e FSH ficam inativos, para que não ocorra outra ovulação, nem ciclo menstrual. No final da gestação a quantidade de progesterona diminui e se iniciam as contrações uterinas. A partir daí, se reinicia o ciclo menstrual.
E a testosterona? A testosterona é um hormônio produzido não só no organismo masculino, mas também no feminino, em pequena quantidade, pelos ovários e glândulas suprarrenais. Ele é responsável por aumentar a libido (desejo sexual) durante o período ovulatório, e contribui para o processo reprodutivo.Em excesso, pode ocasionar acne, pêlos em excesso, alteração na voz, queda de cabelo. Em falta, pode ocasionar perda da libido e cansaço.Alimentação balanceada, com alimentos ricos em zinco, vitaminas A e Z, além da prática de exercícios físicos e também respeito aos períodos de descanso ajudam a combater os principais motivos de alteração na produção da testosterona: o estresse, a má alimentação e o sobrepeso. E a TPM? Causada pelas alterações hormonais que ocorrem na quinzena que antecede a menstruação, o Transtorno Pré Menstrual é uma série de sintomas que podem se manifestar, como a retenção de líquido, causando sensação de inchaço no corpo, deixando as mamas sensíveis, e provocando fortes dores de cabeça (pois o cérebro também incha e é comprimido pela caixa craniana). Consequentemente, alterações de humor, que podem se expressar como nervosismo, irritação, tristeza leve ou mais acentuada, podem completar o quadro. Entenda o ciclo completo Quando vem a menstruação, o corpo encerra um ciclo com a “desconstrução” do endométrio e vasos sanguíneos. O corpo realmente precisará de repouso, pois todo o “esforço” para receber um embrião não foi aproveitado dessa vez e é natural a mulher sentir-se mais cansada, mais lenta e retraída nesse período.Assim que termina o período menstrual, a energia de ação começa a aumentar, juntamente com o nível dos hormônios femininos. O ápice dessa energia, inclusive da libido, é durante o período ovulatório (propiciando que haja a relação sexual que pode gerar uma nova vida).Após a liberação do óvulo é quando a tão temida TPM pode acontecer. Enquanto os níveis de estrógeno e progesterona continuam a subir, preparando o corpo para uma possível gestação, é compreensível que a energia da mulher se volte “para dentro”, com diminuição de libido, necessidade de estar só, e a mente comece a “gestar” projetos próprios também.Quando entendemos que os processos físicos são acompanhados de mudanças emocionais e mentais na mulher, ao longo do mês, regidos pelos hormônios, esse ciclo e suas oscilações fazem todo o sentido.E é por isso que é tão necessário que haja estudos diferenciados sobre os efeitos da Cannabis Medicinal para mulheres. Os homens, regidos basicamente pela testosterona, não sofrem estas variações hormonais mensais. A Menopausa A menopausa é um processo natural que acontece entre os 45 e 55 anos, quando a mulher esgotou seu estoque de óvulos. Nesse período há uma redução dos hormônios sexuais, principalmente o estrogênio. Também a testosterona é reduzida.Muitos dos sintomas da menopausa, como os fogachos, problemas para dormir, mau humor, perda da libido e até de ânimo, junto com a perda de massa muscular, decorrem da diminuição da produção da testosterona.A diminuição dos hormônios femininos estão relacionados com a gradual diminuição do útero, perda de lubrificação do canal vaginal, perda de elasticidade da pele (inclusive no canal vaginal), maiores chances de desenvolver osteoporose, diabetes, problemas cardiovasculares e retenção de líquidos (que resulta em ganho de peso e enxaquecas). Agora que explicamos sobre a fisiologia feminina, vamos falar mais especificamente de como a Cannabis Medicinal atua no organismo feminino. |
Os fitocanabinóides e o Sistema Endocanabinóide
Os fitocanabinóides encontrados na Cannabis sativa são substâncias que conseguem interagir com o Sistema Endocanabinóide presente no nosso organismo.
Resumidamente, o Sistema Endocanabinóide é um sistema pré-homeostático, ou seja, é ele que vai controlar outros sistemas do organismo responsáveis pelo equilíbrio geral e manutenção de saúde física e mental.
O Sistema Endocanabinóide é responsável pelo controle do processo inflamatório e de dor, pela manutenção da temperatura corporal, ciclo do sono, ciclo reprodutivo, variações de humor, sistema imunológico etc.
Pelas explicações que demos até aqui, fica óbvio que o Sistema Endocanabinóide também orquestra as variações no corpo feminino, mês a mês, ano a ano.
Quando o Sistema Endocanabinóide falha (seja por excesso de estresse mental, seja por estresse físico, causado por alguma doença ou acidente), os fitocanabinóides têm condições de estimular seu bom funcionamento novamente.
CBD e THC
O CBD e o THC são os fitocanabinóides mais estudados e utilizados para estimular a retomada do funcionamento do Sistema Endocanabinóide. Ambos possuem propriedades relaxantes, analgésicas, imunomoduladoras, anti inflamatórias, neuroprotetoras, aceleradoras de recuperação dos tecidos, reguladoras do humor e ansiolíticas.
O CBD não altera os sentidos e não vicia, sendo responsável por “acordar” o Sistema Endocanabinóide, para que ele volte a regular os outros sistemas corporais.
O THC é a única substância fitocanabinóide com potencial alucinógeno, quando em altas doses. Seu uso terapêutico é feito em baixas concentrações, associado ao CBD, para proporcionar maior relaxamento e analgesia.
Uso da Cannabis Medicinal por mulheres
Muitas das condições clínicas que prevalecem no público feminino estão relacionadas às alterações hormonais cíclicas mensais e a processos inflamatórios (ou pré-inflamatórios).
Tanto a retenção de líquidos que ocorre antes da menstruação quanto o processo de desfolhamento do útero induzem a um pequeno processo inflamatório, tanto em tecidos do cérebro quanto em outras partes do corpo. Um sistema Endocanabinóide eficiente trata de debelar o processo inflamatório em seu início. Esse é o caso de mulheres que não sofrem com TPM ou sintomas de menopausa, por exemplo.
Cada pessoa apresenta um modo particular de funcionamento do sistema Endocanabinóide, com mais ou menos receptores canabinóides nas células e, quantidades variáveis de substâncias endocanabinóides trabalhando a seu favor. Isso explica porque algumas pessoas são mais propensas a desenvolver determinadas doenças e outras não. São nesses casos que os fitocanabinóides atuam em benefício das pacientes.
Vejamos em que condições clínicas a Cannabis Medicinal pode ajudar as mulheres a terem qualidade de vida.
Endometriose
A Endometriose é o crescimento de tecido endometrial fora da cavidade uterina, em locais como ovários, peritônio pélvico e septo retovaginal. A dor é intensa, difusa, traz sofrimento psicológico e fadiga associados, além de sintomas como cólica menstrual, dor na relação sexual, dificuldade de evacuar e dor ao urinar. É uma condição que afeta de 5 a 15% das mulheres em idade reprodutiva e afeta diretamente a qualidade de vida.
A terapia canabinóide na endometriose é recomendada principalmente para diminuir o processo doloroso e inflamatório, como visto na revisão de literatura publicada no site Lieberpub.
Vários profissionais apostam também na capacidade dos canabinóides de regular o ciclo de renovação celular, chamado apoptose, para diminuir o tecido do endométrio, sem necessidade de intervenção cirúrgica e preservando o útero da paciente ainda em idade reprodutiva.
Enxaqueca
Como vimos anteriormente, a enxaqueca e outros casos de dor de cabeça mais fortes na mulher acompanham não só o período pré-menstrual quanto o da menopausa, devido à atividade hormonal feminina e sua consequente retenção líquida, como num quadro pré-inflamatório.
A terapia canabinóide atua debelando este processo pré-inflamatório e trazendo um efeito analgésico, além de regular a liberação hormonal.
Ansiedade e depressão
Os canabinóides possuem propriedades ansiolíticas e antidepressivas que podem ajudar tanto em casos agudos (como no período pré-menstrual) quanto em casos crônicos, segundo vários estudos.
Sono
Alterações no ciclo do sono acompanham períodos de alteração hormonal, como a menopausa, bem como quadros de dor crônica, ansiedade e depressão. A terapia canabinóide regula esse ciclo, recuperando as noites bem dormidas.
Libido
As alterações da libido estão ligadas ao desequilíbrio hormonal (principalmente da testosterona) e a terapia canabinóide pode ajudar no reequilíbrio hormonal feminino, devolvendo a libido.
Dor na relação sexual
A dor na relação, quando não relacionada à lubrificação, pode ter fundo físico ou psicológico. A terapia canabinóide, seja pelo uso oral tanto para relaxar a mente, seja com o uso de cremes locais, auxilia as mulheres a resgatarem o prazer durante a relação sexual, como verificado em artigo publicado na Pubmed.
Dores crônicas e doenças autoimunes
Com predominância entre o sexo feminino, dores crônicas e doenças autoimunes podem ser tratadas com terapia canabinóide, devido a seus múltiplos benefícios: debela o quadro inflamatório, protege os tecidos de degeneração, controla a dor e impede a evolução de quadros degenerativos.
As mulheres estão abertas à terapia canabinóide
É interessante notar que as mulheres estão abertas à terapia com Cannabis medicinal para tratar das diversas condições ginecológicas, como prova um estudo nos Estados Unidos, de 2020.
Em artigo da Medscape, de 2021, as mulheres americanas têm recorrido ao uso do CBD como alternativa à analgésicos, opióides e outros tratamentos convencionais, no que se refere tanto a problemas recorrentes de origem hormonal (por exemplo, as enxaquecas mensais que acompanham o período menstrual), quanto para quadros mais complexos, como fibromialgia, doenças auto-imunes (como Doença de Crohn) Stress pós-traumático, endometriose, dores crônicas pós-acidentes, além de adjuvante no tratamento de câncer, combatendo os efeitos colaterais da quimioterapia.
Uma pesquisa recente no Journal of Women’s Health com quase 1.000 mulheres mostra que 90% (a maioria entre 35 e 44 anos) usaram cannabis e considerariam usá-la para tratar a dor ginecológica. Aproximadamente 80% disseram que considerariam usá-lo para dor relacionada ao procedimento ou outras condições.
Se você quer colher os benefícios da Cannabis Medicinal em sua vida e não sabe por onde começar, fale com nosso Suporte para receber as orientações necessárias.
Ana Claudia Marques é redatora da CBD Fast Lane, escritora, Terapeuta Ocupacional, pós-graduada em Medicina Tradicional Chinesa e terapias integrativas, além de estudiosa sobre o potencial terapêutico das plantas.