O potencial terapêutico da Cannabis medicinal vem sendo estudado em diversas partes do mundo em patologias oculares, como o glaucoma, retinopatias (como Retinopatia Diabética, Uveítes e Blefaroespasmo). Os olhos possuem receptores canabinóides em todos os seus componentes e existem pesquisas mostrando que alguns canabinóides podem diminuir a pressão ocular. Já existem também pesquisadores empenhados em criar um colírio com canabinóides para o tratamento de diversas patologias nos olhos.
Ainda não existem tratamentos com canabinóides cujo efeito dure mais de quatro horas, o que torna um impeditivo o uso recorrente. Mas a possibilidade de uso concomitante com o tratamento convencional é possível e deve ser considerada, principalmente quando o paciente é refratário a outros medicamentos.
O que é Cannabis Medicinal?
A Cannabis é uma planta conhecida popularmente por seu uso recreativo, como maconha. Mas seus componentes, os canabinóides, possuem propriedades terapêuticas reconhecidas, que vem sendo bastante estudadas a partir da década de 1980, após ter sido largamente demonizada como droga de abuso no início do século XX.
Antes disso, a Cannabis tinha um status terapêutico reconhecido na Europa, Oriente e também aqui no Brasil, devido a muitos médicos e veterinários europeus que aprenderam nas colônias espalhadas pela Ásia sobre o uso corrente da Cannabis, não só cerimonial, mas medicinal, em problemas neurológicos, epilepsias, derrames, problemas femininos, ansiedade, depressão etc.
Todo esse potencial terapêutico já estava registrado em tratados de medicina Ayurvédica, chinesa e do Oriente Médio, há mais de 6 mil anos. Ou seja, hoje os cientistas conseguem provar aquilo que os antigos terapeutas sabiam pela prática diária e, com recursos ultramodernos, conseguem também catalogar as diferentes substâncias que compõem esta planta extraordinária.
Canabinóides
Hoje já são conhecidos 104 canabinóides,além de inúmeros terpenos e flavonoides, entre mais de quinhentos compostos presentes na Cannabis. CBD é o canabidiol, um dos primeiros canabinóides a serem estudados e que se encontra em grande quantidade na Cannabis, com reconhecidas funções terapêuticas. Não psicotrópico, o CBD atua como anti-inflamatório, analgésico, antiemético, antipsicótico, ansiolítico, anticonvulsivante, neuroprotetor, antidepressivo, usado também para melhorar a qualidade do sono.
O THC é o tetrahidrocanabinol, o único canabinóide com potencial psicotrópico, alucinógeno e de dependência química. Apesar disso, possui inúmeras aplicações terapêuticas e é com ele que se encontram os melhores resultados para diminuir a pressão intraocular no glaucoma.
O THC tem composição praticamente idêntica a um endocanabinóide (canabinóide produzido por nosso próprio corpo) chamado Anandamida (não por acaso Ananda é “felicidade” em sânscrito). Suas propriedades terapêuticas incluem: relaxamento muscular, regulação das funções corporais, desativação/regulação de sinapses,neuroproteção, sensação de bem-estar/felicidade, diminuição das expressões de stress (como ansiedade, medo, insônia, agitação e hiperatividade intestinal, por exemplo), diminuição da dor e modulador do sistema imunológico hiperativo.
Os óleos medicinais Full Spectrum de Cannabis contém todos estes compostos, que atuam sinergicamente. Outros tipos de composições trazem canabinóides isolados, como os óleos com CBD. Vale dizer que já se sabe que os efeitos indesejáveis do THC são moderados pelos outros canabinóides, terpenos e flavonóides presentes na planta. De qualquer forma, a maior parte dos produtos de Cannabis Medicinal comercializados no Brasil possuem uma concentração de THC menor do que 0,3%.
Formulações com 1% de THC ou mais são utilizadas em patologias mais graves, com convulsões e espasmos involuntários ou no cuidado paliativo de pacientes com câncer ou outras doenças terminais.
Terpenos e flavonóides
Presentes em todas as plantas em maior ou menor grau, terpenos e flavonóides são utilizados em óleos, cremes, infusões, compressas e chás com as plantas medicinais que os contém em concentrações terapêuticas.
Simplificadamente, terpenos são responsáveis pelo aroma e sabor que sentimos nos vegetais. Flavonóides são responsáveis pela cor dos alimentos. As propriedades terapêuticas de terpenos e flavonóides já são bem conhecidas e utilizadas, não só na aromaterapia, como calmantes ou estimulantes do sistema nervoso, mas também por serem bactericidas, virucidas, antioxidantes, antiinflamatórios, antitumorais e analgésicos.
Sistema Endocanabinóide regula parcialmente a visão
Os olhos são uma estrutura fantástica. Quando a luz penetra nos olhos, atinge fotorreceptores na superfície da retina e, resumidamente, a luz se transforma em um sinal elétrico, que segue via neurônios para o córtex visual do cérebro.
A comunicação entre retina e Sistema Nervoso, o nervo ótico precisa de vários neurotransmissores: serotonina, dopamina, GABA, Glutamato, entre outros. E é aí que os canabinóides podem atuar, pois a expressão destes neurotransmissores depende da modulação direta pelo Sistema Endocanabinóide.
O Sistema Endocanabinóide (SEC) está presente em todo o organismo e também no olho. Ele possui os chamados receptores canabinóides (CB e CB2), que se ligam às substâncias canabinóides endógenas (produzidas por nosso corpo, como a Anandamida e o 2-AG) e exógenas (como os fitocanabinóides da Cannabis ou canabinóides sintéticos).
Grande parte dos estudos científicos foca exatamente em como os canabinóides interagem com CB1 e CB2 e os resultados práticos disto. Infelizmente, os estudos ainda não chegaram em seres humanos, somente em cobaias.
Onde se expressa o SEC nos olhos?
O SEC está presente em todo o olho. Receptores CB1 foram encontrados no corpo ciliar, malha trabecular, no copo ciliar não pigmentado e nos epitélios conjuntivos. Também foram encontrados no núcleo geniculado lateral (conexão do nervo óptico com o lobo ociptal), no córtex visual primário e secundário.
Já a Anandamida e o 2-AG – os endocanabinóides produzidos pelo SEC – foram detectados na córnea, corpo ciliar, íris e na coróide, bem como na retina.
Na retina, ambos os receptores, CB1 e CB2, estão presentes em praticamente todas as estruturas. Isto sugere que o SEC atua como um regulador da neurobiologia da retina e na transformação das informações visuais.
Como os canabinóides podem agir nos olhos?
Os canabinóides regulam os neurotransmissores. Para que a visão possa acontecer:
- a dopamina é necessária para o olho adaptar-se à luz;
- a serotonina para que a comunicação entre os neurônios ocorra perfeitamente;
- glutamato e GABA para que ocorra a transmissão da informação da retina para o SNC.
É por este motivo que cientistas continuam buscando alternativas para o uso efetivo da Cannabis medicinal para melhorar a saúde ocular. Com o que já sabemos, de maneira sistêmica, o uso da Cannabis medicinal pode ajudar a regular a produção destes neurotransmissores, proteger os neurônios, controlar quadros inflamatórios e de dor, além de ajudar no controle do índice glicêmico.
Desta forma ela já contribui impedindo o avanço de várias doenças que podem culminar com a perda da visão e ajuda em quadros inflamatórios e de dor.
Estudos sobre o uso da Cannabis na oftalmologia
Como dissemos no início deste artigo, ainda não se pode falar em uma aplicação direta de um colírio com canabinóides ou mesmo do uso do óleo medicinal ou uso fumado para este fim, pois a substância que comprovadamente reduz a pressão intraocular é o THC.
Como destaca um estudo publicado na Revista Médica de Minas Gerais, os efeitos do uso tópico ou indireto passam em quatro horas e o risco de desenvolver dependência, além de efeitos colaterais nos pacientes, com o uso 6 vezes por dia é proibitivo.
Entretanto, o uso da Cannabis medicinal complementando o tratamento convencional pode ser feito, visto que muitas patologias oculares são decorrentes de outros quadros clínicos, como o diabetes, cujo controle do nível glicêmico é beneficiado pelo tratamento com canabinóides.
Patologias oculares como uveítes e retinopatia diabética também podem se beneficiar pelo potencial antiinflamatório, neuroprotetor e analgésico da Cannabis Medicinal, acompanhando os outros medicamentos e retardando a evolução da doença.
Outros estudos também consideram o potencial antiespasmódico para tratamento do blefaroespasmo, se o tratamento convencional falhar. Cientistas buscam hoje também em outros canabinóides da planta, menos estudados, possíveis agentes terapêuticos efetivos para estas patologias.
Também um estudo de revisão, de 2019 sugere que os canabinóides podem ter um papel importante no processamento e função da retina.
Portanto, se apresentar algum destes problemas de visão e o tratamento convencional não estiver surtindo efeito, vale conversar com o oftalmologista a possibilidade de incluir a Cannabis Medicinal como adjuvante no arsenal terapêutico.
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Ana Claudia Marques é redatora da CBD Fast Lane, escritora, Terapeuta Ocupacional, pós-graduada em Medicina Tradicional Chinesa e terapias integrativas, além de estudiosa sobre o potencial terapêutico das plantas.