Novas pesquisas vêm surgindo com dados importantes sobre a ação antitumoral dos canabinóides. A Cannabis medicinal já é utilizada no tratamento do câncer, aliviando os efeitos da quimioterapia, como dores, mal-estar e falta de apetite, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.
Mas vamos além, trazendo pesquisas recentes sobre a aplicabilidade do uso de canabinóides para conter o avanço do câncer, presentes no livro Conexão Cannabis e Câncer: como usar cannabis e cânhamo para matar células cancerígenas, (Joe D. Goldstrich e Angela Bacca, 2023, ainda sem versão em português).
Fitocanabinóides e o Sistema Endocanabinóide
Os fitocanabinóides da Cannabis conseguem interagir com o Sistema Endocanabinóide (SEC) existente no organismo (tanto humano como da maioria dos animais). Nas últimas décadas o SEC foi descoberto por cientistas que estudavam as propriedades terapêuticas da Cannabis.
Descobriu-se que o Sistema Endocanabinóide funciona como um regulador pré-homeostático do organismo. Como ele faz isso?
Produzindo substâncias endocanabinóides: a Anandamida e o 2 – araquidonilglicerol (2-AG). Estes são neurotransmissores lipídicos, produzidos somente por demanda (quando existem alterações agudas ou crônicas na homeostase da célula), ajudando a controlar as várias funções corporais: sistema imunológico, temperatura corporal, processos inflamatórios, percepção de dor, sistema reprodutor, alterações de humor, ciclo do sono-vigília e muito mais.
Quando o SEC não está funcionando corretamente, o uso da Cannabis medicinal consegue regular este sistema, já que os fitocanabinóides tem estrutura semelhante aos endocanabinóides.
Pesquisas dos últimos anos conseguiram detalhar a ação de vários fitocanabinóides quando o assunto são células cancerígenas e seu poder de metástase. O que fica cada vez mais evidente é que o óleo medicinal de Cannabis, com seu efeito sinérgico entre seus componentes (canabinóides, terpenos e flavonóides) contém compostos antineoplásicos que precisam ser considerados, confirmando casos anedóticos de pacientes e profissionais da saúde.
Receptores canabinóides nas células tumorais
Hoje sabe-se que as células cancerígenas possuem receptores canabinóides, CB1 e CB2. Essa é uma evidência importante, pois demonstra que os fitocanabinóides podem interagir com estas células e interferir na progressão da doença. Mas como eles fazem isso?
THC
O THC foi o primeiro fitocanabinóide a ser estudado. Em 1975 uma pesquisa já trazia evidências de seu potencial anti-cancerígeno (como)
Atualmente sabe-se que o THC liga-se aos receptores canabinóides CB1 e CB2 da célula cancerígena e induz a morte desta célula – a chamada apoptose celular. Isso acontece inclusive em tumores de alta malignidade, relacionados ao sistema imunológico, como linfomas e leucemias.
Além de induzir a apoptose, o THC também consegue reduzir a dor ao ligar-se a receptores CB1 nos nervos, responsáveis por transmitir impulsos dolorosos de volta ao cérebro.
O THC, assim como o CBD, bloqueia a produção do Fator de Crescimento Endotelial Vascular, uma enzima que estimula o crescimento de novos vasos sanguíneos que alimentam a massa tumoral.
CBD
O CBD atua no Sistema Endocanabinóide ativando outras vias diferentes dos receptores CB1 e CB2. Ainda assim, estudos mostram que este fitocanabinóide também induz a apoptose das células cancerígenas, além de ter atividades antiproliferativas e anti invasivas. Como isso acontece?
O CBD atua sobre o gene ID-1, ativo em recém-nascidos e na primeira infância, onde a proliferação de tecidos e a taxa de crescimento do organismo é alta. Quando o organismo torna-se adulto, este gene deveria ser inativado. Porém em casos de câncer com alto poder metastático, este gene é ativado pelas células tumorais.
O CBD consegue “desligar” este gene ID-1, diminuindo não só a vascularização, mas também a taxa de crescimento do tumor e a capacidade de invadir novos tecidos saudáveis, causando metástase.
Uma pesquisa de 2015, investigando o uso da Cannabis medicinal como alternativa para melanomas resistente à quimioterapia demonstrou que o uso de um óleo de Cannabis composto por THC e CBD na proporção de 1:1 a camundongos portadores de xenoenxertos de melanoma “inibiu substancialmente a viabilidade, proliferação e crescimento do tumor do melanoma, paralelamente a um aumento na autofagia e apoptose em comparação com o padrão temozolomida como agente único.”
Um ensaio clínico fase 2, duplo-cego, com Sativex (composto de CBD e THC na proporção de 1:1, em forma de spray oral) testou sua eficácia em pacientes com glioblastoma multiforme recorrente no tratamento junto com o quimioterápico Temozolomida. Este é um tipo de câncer de prognóstico bastante ruim e resistente aos tratamentos convencionais.
Participaram deste ensaio 21 pacientes com glioblastoma recorrente. O grupo controle usou uma dose relativamente baixa de Sativex (12 pulverizações por dia) mais o quimioterápico. O grupo placebo recebeu somente a temozolomida.
Como resultado, a sobrevida do grupo controle por mais de um ano foi de 83% (em média, um ano e meio), e a sobrevida do grupo placebo por mais de um ano foi de 53% (em média, um ano). É relevante notar que a dose de Sativex ministrada foi abaixo do que é normalmente preconizado em outros tratamentos e mesmo assim os resultados já foram positivos e relevantes. Também é importante notar que a utilização concomitante de quimioterapia e Cannabis medicinal trouxe resultados sinérgicos positivos.
CBG, CBN e outros componentes da Cannabis
Várias pesquisas demonstram que o canabigerol (CBG) e canabinol (CBN), além do CBN, tetrahidrocanabivarina (THCV) e a canabidivarina (CBDV), possuem atividade anti-cancerígena, induzindo apoptose e provocando oxidação de células cancerígenas (no caso do CBG), em várias linhagens de cancer, especialmente de glioblastoma, câncer de colo do reto e de mama, todos de difícil prognóstico.
Outra pesquisa de 2016 mostra que os canabinóides “crus” ou ácidos, como o CBDA, THCA e CBGA (precursores do CBD, THC e outros que se transformam após o aquecimento do óleo da Cannabis) tem um potencial anti cancerígeno muito grande, atuando contra tipos agressivos de câncer de mama e de próstata.
Estes achados foram corroborados por duas pesquisas japonesas. A primeira pesquisa demonstrou que o CBGA impediu a metástase de células cancerígenas. A segunda pesquisa mostrou que o uso concomitante de CBDA e CBGA diminuiram a inflamação e crescimento de células cancerígenas, ao inibir a enzima envolvida neste processo.
Terpenos e flavonoides
Uma revisão de farmacologia sobre os terpenos da Cannabis enumerou aqueles com atividades anti tumorais comprovadas: limoneno, ɑ-terpineol, canfeno, β-elemeno, guaiol e eudesmol.
Em 2019 foi descoberto por pesquisadores de Harvard e Massachussets que um derivado do flavonóide Canaflavina B atua contra células do câncer de pâncreas, inclusive com potencial antimetastático. Outros flavonóides também possuem atividade anti cancerígena.
Efeito comitiva: tudo junto é melhor
Como vimos até aqui, estudos envolvendo substâncias isoladas da Cannabis medicinal vem comprovando seu potencial contra o câncer, atuando sobre a inflamação gerada pelo stress oxidativo das células, impedindo seu crescimento e proliferação em tecidos saudáveis.
Se eles atuam bem isoladamente, os pesquisadores concordam que o uso do óleo Full Spectrum, com todos os componentes, tende a trazer resultados melhores, devido ao Efeito Entourage ou Comitiva, quando os diversos canabinóides, flavonóides e terpenos agem sinergicamente no organismo.
Um caso real
Em reportagem para a UOL, a biomédica Gisele Thame, de 64, contou que iniciou um tratamento paliativo com Cannabis medicinal para aliviar os sintomas de dor, problemas de sono, depressão e estresse, ligados a um diagnóstico de tumor cerebral, um adenoma hipófise não-hormonal, cujo único tratamento era a remoção por cirurgia.
Ante a possibilidade de, após a remoção do tumor, ficar dependente de 22 remédios, a biomédica escolheu não fazer a remoção e fazer somente o tratamento paliativo. Com o início do tratamento com a Cannabis medicinal, os sintomas de dor, depressão, alteração de humor e do sono melhoraram.
Para sua surpresa e da psiquiatra que lhe prescreveu a Cannabis medicinal, com um ano e meio de uso, o tumor diminuiu de 1,3 centímetros – considerado grande – para 0,7 milímetros. Ou seja, o tumor entrou em remissão. Éimportante saber que existem receptores do sistema Endocanabinóide na hipófise, o que sugere que o uso de fitocanabinóides sejam benéficos para tumores nessa glândula.
Ainda que faltem muitos estudos em humanos e os resultados possam ser diferentes em organismos diferentes, estudos iniciais in vitro trazem resultados positivos para a redução de tumores, e há outros casos de pacientes que obtiveram melhoras durante o uso da Cannabis medicinal.
No caso real da biomédica, seu tratamento paliativo para o câncer foi bem sucedido e o achado da redução do tumor foi algo inesperado e bem-vindo. Hoje, à luz das pesquisas médicas, não podemos ainda afirmar categoricamente que a Cannabis medicinal possua uma propriedade antitumoral, mas podemos afirmar que ela devolve a qualidade de vida a pacientes oncológicos, como foi o caso desta paciente também.
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Ana Claudia Marques é redatora da CBD Fast Lane, escritora, Terapeuta Ocupacional, pós-graduada em Medicina Tradicional Chinesa e terapias integrativas, além de estudiosa sobre o potencial terapêutico das plantas.